A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou, na segunda-feira (14/10), o início dos testes clínicos da LepVax, a primeira vacina desenvolvida especificamente para combater a hanseníase. Sob a coordenação do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) e patrocinada por Bio-Manguinhos/Fiocruz, a pesquisa traz novas perspectivas para o enfrentamento de uma doença que ainda afeta milhares de pessoas no Brasil.
Fiocruz: tradição e inovação no combate à hanseníase
Com uma extensa trajetória em pesquisas e assistência na área, a Fiocruz foi escolhida para liderar o ensaio clínico. O Brasil é o segundo país com maior número de casos de hanseníase no mundo, atrás apenas da Índia. Entre 2014 e 2023, foram notificados quase 245 mil novos casos no território brasileiro, com 22.773 diagnósticos apenas no ano passado.
A hanseníase é uma doença infecciosa que pode causar danos permanentes, especialmente nos nervos, se não for tratada precocemente. A criação de uma vacina específica é um passo fundamental na prevenção, uma vez que a imunização atual com a vacina BCG oferece proteção limitada e é voltada para grupos de maior risco.
LepVax: um avanço esperado há décadas
Desenvolvida pelo Access to Advanced Health Institute (AAHI), uma organização de pesquisa biotecnológica dos Estados Unidos, a LepVax é projetada para atuar tanto na prevenção quanto no tratamento da hanseníase. Estudos pré-clínicos apresentaram resultados promissores, com redução das taxas de infecção em camundongos expostos à bactéria Mycobacterium leprae.
Em outro estudo, envolvendo tatus — modelo comum em pesquisas neurológicas para essa doença —, a vacina demonstrou eficácia ao retardar danos aos nervos motores e sensoriais. Esses achados indicam que a LepVax pode ir além da prevenção, oferecendo também um impacto terapêutico positivo.
Estudo clínico inédito no Brasil
O Brasil será o primeiro país com transmissão ativa de hanseníase a testar a LepVax em seres humanos. O ensaio clínico será realizado com 54 voluntários saudáveis e tem como objetivo avaliar tanto a segurança quanto a capacidade da vacina de estimular a resposta imunológica. Os participantes serão divididos em três grupos: dois receberão doses diferentes da vacina, enquanto o terceiro atuará como grupo de controle, recebendo placebo.
Esse estudo será conduzido no formato de ensaio randomizado, duplo-cego e controlado por placebo, considerado o padrão-ouro para testes clínicos. Isso significa que nem os voluntários nem os pesquisadores saberão, durante o processo, quem recebeu a vacina ativa e quem recebeu placebo.
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Critérios para participação e acompanhamento médico
Os voluntários interessados precisam ter entre 18 e 55 anos, estar em boas condições de saúde e não podem ter histórico de hanseníase ou contato direto com pacientes diagnosticados. Gestantes também não podem participar da pesquisa, em razão das exigências de segurança para essa fase de estudos.
O acompanhamento dos participantes ocorrerá ao longo de 14 meses, com 11 visitas agendadas para exames clínicos e aplicação das doses. Durante esse período, a equipe médica realizará avaliações detalhadas, coletando amostras de sangue e urina para garantir a segurança e a eficácia da vacina.
O impacto esperado para a saúde pública
Embora a hanseníase tenha cura e o tratamento esteja disponível no Sistema Único de Saúde (SUS), o diagnóstico precoce ainda é um desafio. Muitos pacientes recebem o diagnóstico em estágios avançados, quando os danos à saúde já comprometem sua qualidade de vida. Com a LepVax, a expectativa é que a vacina possa, no futuro, ser incorporada ao calendário nacional de imunizações, fortalecendo a prevenção e reduzindo a transmissão da doença.
Esse avanço coloca o Brasil na vanguarda da pesquisa contra a hanseníase, trazendo esperança de uma solução definitiva para essa condição milenar. Com a colaboração entre Anvisa, Fiocruz e outras instituições envolvidas, o país dá um passo para erradicar a doença e oferecer mais saúde e dignidade à população.