Categoria Economia

Trabalho doméstico na Índia ganha valor e muda a vida de milhões de mulheres

A Índia ampliou programas de renda que reconhecem financeiramente o trabalho doméstico feminino, alcançando 118 milhões de mulheres em 12 estados.

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O trabalho doméstico na Índia, por décadas invisível nas estatísticas oficiais, começou a ganhar reconhecimento prático na vida cotidiana. Nos últimos anos, em 12 estados do país, governos locais passaram a transferir renda diretamente para mulheres adultas, sem exigir contrapartidas. Com isso, a política alcança 118 milhões de beneficiárias e inaugura uma nova leitura sobre como o cuidado familiar passa a ser tratado pelo poder público.

Diferentemente do modelo indiano tradicional, baseado em subsídios a alimentos, combustíveis ou empregos rurais, a nova abordagem deposita mensalmente entre 1 mil e 2,5 mil rúpias nas contas das mulheres. Na prática, o valor — equivalente a R$ 65 a R$ 162 — representa até 12% da renda média familiar. Assim, o trabalho doméstico na Índia deixa de ser apenas uma obrigação silenciosa e passa a ter impacto direto no orçamento da casa.

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Como a política começou e se espalhou

Inicialmente, a experiência surgiu em Goa, ainda em 2013. Anos depois, Assam ampliou o alcance do modelo a partir de 2020, durante o período pré-pandemia. A partir daí, outros estados passaram a adotar programas de remuneração semelhantes. Em Tamil Nadu, por exemplo, o pagamento é descrito oficialmente como um direito, numa referência explícita ao cuidado diário com filhos, idosos e tarefas domésticas. Da mesma forma, Bengala Ocidental e Maharashtra priorizaram mulheres adultas como eixo central da política social.

Para organizar o acesso, os critérios de elegibilidade excluem famílias de servidores públicos, contribuintes do imposto de renda e grandes proprietários. Segundo a professora Prabha Kotiswaran, do King’s College London, em declaração à BBC, as transferências ampliam os sistemas de bem-estar social dos estados indianos em favor das mulheres.

“As transferências financeiras incondicionais representam uma expansão dos sistemas de bem-estar social dos estados indianos em favor das mulheres.”
— Prabha Kotiswaran, professora de Direito e Justiça Social do King’s College London, em entrevista à BBC

Efeitos da remuneração do trabalho doméstico na Índia

No dia a dia, o dinheiro recebido cobre despesas essenciais. Entre elas, alimentação, gás de cozinha, material escolar e medicamentos aparecem como destinos frequentes do recurso. Em alguns casos, há investimento em pequenas joias ou insumos de trabalho. Soma Das, moradora de Bengala Ocidental, por exemplo, utiliza o valor para comprar tecidos e confeccionar roupas que ajudam a sustentar a família.

Além disso, estados como Maharashtra já atendem cerca de 25 milhões de mulheres. Em Odisha, o alcance chega a 71% do eleitorado feminino. Diante desse cenário, o peso social do programa de remuneração do trabalho doméstico na Índia passou a influenciar decisões políticas, reforçando o bem-estar doméstico como tema central nas disputas eleitorais.

Embora ainda faltem estudos de longo prazo para avaliar impactos amplos — como ocorre no Brasil com o Bolsa Família —, relatos locais indicam alívio imediato e maior autonomia financeira. Nesse contexto, ao reconhecer o trabalho doméstico na Índia como parte real da economia, o país abre espaço para uma nova compreensão sobre cuidado, renda e dignidade feminina.