Há exato um século, as paisagens culturais do Recife começaram a ser transformadas de maneira indelével. Na última quarta-feira (31) celebrou-se o centenário de Abelardo da Hora (1924-2014), um dos maiores expoentes das artes plásticas em Pernambuco. Além de ser um escultor cujas obras dialogam profundamente com a cultura popular e evidenciam um forte engajamento político, Abelardo da Hora desempenhou um papel fundamental na renovação e fortalecimento do cenário cultural do estado.
A Influência do realismo e expressionismo
A xilogravura “Meninos do Recife” é um dos trabalhos mais emblemáticos de Abelardo da Hora, onde ele expõe a miséria ao representar crianças magras e vulneráveis. Este trabalho demonstra uma afinidade com o realismo e o expressionismo, estilos que se refletem também em suas esculturas, muitas das quais são elaboradas em bronze, mármore e cimento. O uso do cimento, em particular, com sua textura áspera, confere uma dimensão de sofrimento às suas figuras, intensificando a mensagem social de suas obras.
Perseguição política durante a ditadura
Abelardo da Hora foi uma figura marcante não apenas no campo das artes, mas também na política. Integrante do clandestino Partido Comunista durante a ditadura militar, ele foi perseguido e preso mais de 70 vezes. Sua veia política é evidente em suas obras, que frequentemente abordam temas de injustiça social e resistência.
Obras espalhadas pelo Recife
O legado de Abelardo da Hora está espalhado por toda a cidade do Recife. Entre suas esculturas mais conhecidas estão o “Monumento aos Retirantes” no Parque Dona Lindu, a “Mulher Sereia” no Mar Hotel, o “Monumento ao Maracatu” próximo ao Forte das Cinco Pontas e o “Monumento ao Frevo” na Rua da Aurora. Seu acervo, que inclui quase 300 peças entre esculturas, telas e outras obras, é um testemunho da sua prolífica carreira.
Doação de obras à Paraíba
Em 2018, a família de Abelardo da Hora doou 179 obras à Paraíba. A decisão foi motivada pela dificuldade de “abrigar, manter, preservar e divulgar a obra e a memória do artista” desde sua morte em 2014. Essa doação é um exemplo do esforço contínuo para preservar e celebrar o legado de Abelardo da Hora.
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Biografia de Abelardo da Hora
Abelardo Germano da Hora nasceu em São Lourenço da Mata, Pernambuco, em 31 de julho de 1924. Ele estudou Artes Decorativas no Colégio Industrial Professor Agamenon Magalhães e frequentou o Curso Livre de Escultura na Escola de Belas Artes do Recife. Abelardo foi aluno de Cassimiro Correia e, em 1942, liderou o Diretório Acadêmico de Belas Artes.
Durante sua carreira, Abelardo da Hora foi contratado pelo industrial Ricardo Brennand para trabalhar na Cerâmica São João, onde produziu diversas obras com motivos regionais e orientou o futuro ceramista Francisco Brennand. Em 1946, participou da criação da Sociedade de Arte Moderna do Recife, que dirigiu por quase dez anos. Sua primeira exposição de esculturas ocorreu em 1948, na Associação dos Empregados do Comércio de Pernambuco.
Contribuições e reconhecimento internacional
Abelardo da Hora realizou inúmeras exposições internacionais entre 1957 e 1958, incluindo Estados Unidos, Europa, Argentina, Mongólia, União Soviética, Israel e China. Em 1960, ele idealizou a lei municipal de “Obras de Arte em Edificações no Recife”, transformando a cidade em uma galeria de arte a céu aberto.
Obras de destaque
Entre as produções mais admiradas de Abelardo da Hora estão o “Monumento aos Heróis da Revolução Pernambucana” (1994), encomendado pelo Governo de Pernambuco, e o “Monumento aos Retirantes” (2008).